VI.
ADVERTÊNCIAS
CONTRA O ORGULHO DA CARNE E INSTRUÇÕES EM PIEDADE
(Capítulo
VI)
O Apóstolo nos advertiu
contra religiosidade da carne que apostata da verdade e adota asceticismo (Cap.
4); e contra a carne mundana, levando à indiferença e deleites próprios (5);
agora no capítulo final somos advertidos contra o orgulho da carne que cobiça
dinheiro e vantagens mundanas. Para enfrentar esses males o Apóstolo nos
reforça novamente a piedade prática (vs. 3, 5, 6, 11).
No curso de sua exortação o
Apóstolo passa diante de nós o Cristão servo (vs. 1,2); o soberbo e ignorante
professante do Cristianismo (vs. 3-8); o apóstata, seduzido pelas riquezas do
mundo (vs. 9-10); o homem de Deus (vs. 11-12); Cristo o perfeito exemplo
(vs.13-16); o crente que é rico neste mundo (vs.17-19); e o cientista professo
(vs. 20,21).
(a) Cristãos servos (vs. 1-2)
(v.1) O capítulo
adequadamente abre com instrução para Cristão que é servo. O tal pode tentar
usar o Cristianismo como meio de melhorar sua posição social. A instituição da
escravidão pode de fato ser inteiramente contrária ao espírito do Cristianismo.
Todavia o grande objeto da Casa de Deus não é colocar o mundo em ordem, nem
para promover os interesses mundanos daqueles que formam a casa, mas manter a
glória do Nome de Deus e testemunhar, e sustentar, a verdade. O servo Cristão
deveria mostrar toda honra ao seu senhor incrédulo, para que não haja nada em
sua conduta que possa justamente lançar qualquer mácula sobre o Nome Daquele
que habita na Casa, ou que negue a verdade que a Casa de Deus deve manter.
(v.2) O Apóstolo dá um aviso
especial ao servo Cristão que tem senhor crente. O fato de que seu mestre é um
irmão no Senhor não deveria ser usado para colocar de lado o respeito que é
devido de um servo ao seu mestre. Qualquer falta de respeito apropriada seria
uma tentativa por parte do servo de usar o Cristianismo para subir em sua
posição social, procurando assim sua própria vantagem mundana.
Na Assembleia o servo e o
seu senhor estão num terreno comum, igual diante do Senhor. Ali, de fato o
servo, por causa de sua espiritualidade ou dom, pode ser mais proeminente do
que seu senhor terreno. Que os servos crentes possam, no entanto, ter cuidado
para que não sejam tentados a abusarem dos privilégios da Assembleia fazendo
dela um terreno para familiaridade indevida com seus senhores, nos afazeres
diários da vida. Esteja longe de folgar em suas funções aos senhores que são
crentes, mas em vez disso deveriam render-lhes serviço porque eles são fiéis e
amorosos e participantes dos benefícios Cristãos.
(b) O professante ignorante, destituído da verdade (vs. 3-8)
(v.3) Claramente então o
Cristianismo não é um sistema para o crescimento da nossa posição social neste
mundo. É verdade que o crente, ao passar por este mundo, deve fazer o bem, e
que a presença do Cristão e a correta conduta do Cristão deve ter um efeito benéfico.
Contudo, o grande objeto da Casa de Deus não é melhorar o mundo, mas
testemunhar a graça de Deus a fim de que os homens possam ser salvos para fora
do mundo que, apesar de civilizado e de qualquer melhoria social, vai ser
julgado.
Aparentemente naqueles
primeiros dias havia aqueles que ensinavam o contrário. Viam o Cristianismo
meramente como um meio de melhorar a condição social de homens e mulheres e
assim fazendo deste mundo um lugar melhor e mais brilhante. Provavelmente eles
estavam ensinando que os servos convertidos, tendo vindo sob o Senhorio de
Cristo, poderiam considerar-se livres dos seus senhores terrenos. Tais visões,
entretanto, eram contrárias às sãs palavras; e as palavras do nosso Senhor
Jesus Cristo, e ensino, que é de acordo com a piedade.
Assim novamente o Apóstolo
traz a piedade como proteção contra o abuso dos nossos privilégios Cristãos.
Piedade caminha no temor de Deus, confiando no Deus vivo que é o preservador de
todos os homens. Assim andando devemos nos preservar de buscar usar o
Cristianismo simplesmente como um meio de melhorar a nossa posição no mundo.
(vs.4,5) Tendo mostrado que
a piedade é a proteção contra o abuso do Cristianismo, o Apóstolo declara que
aquele que ensina outra doutrina é movido pelo orgulho da carne. Orgulho que
confia em si mesmo e procura manter a importância própria, é completamente
oposto à piedade que confia em Deus e busca Sua glória.
Por trás desse orgulho há a
ignorância sobre a mente de Deus que é transmitida em Suas palavras. Essa
ignorância a respeito da mente do Senhor surge pelo deixar a mente humana estar
ocupada com as infindáveis questões levantadas pelos homens e contendas sobre
palavras. Completamente indiferente ao poder moral da fé Cristã trabalhando na
alma e conduzindo à vida de piedade, os homens tratam o Cristianismo como se
fosse “questões e disputas de palavras”.
Tais disputas de palavras,
em vez de fortalecer a piedade apenas dá ocasião para manifestações de obras da
carne. O orgulho que busca exaltação própria por meio dessas infindáveis
palavras deve inevitavelmente levar à “inveja”; porque para o homem orgulhoso
não pode haver rival. Naturalmente a carne se esforçará contra aquele que é
invejoso. Então a inveja leva à contenda, e contender contra outro levará a
“injuriosas palavras” sobre ele. O conhecimento de que “palavras injuriosas”
estão sendo proferidas levantará “más suspeitas” e “constantes desavenças”. Tal
é a colheita do mal que surge da inveja. Não há poder maior para o mal entre os
santos de Deus do que permitir a inveja no coração. “A ira é cruel e a raiva é
ultrajante; mas” diz o pregador “quem é capaz de permanecer diante da inveja?”
Foi a inveja que levou ao primeiro homicídio neste mundo; e foi a inveja que
levou ao maior homicídio deste mundo. Pilatos “sabia que por inveja eles O
haviam entregado” (Mt. 27:18).
Ai de nós! Esta inveja pode aparecer entre o verdadeiro
povo de Deus. Aqui o Apóstolo volta ao orgulho do coração que é corrupto e
destituído da verdade do Cristianismo. O motivo fundamental disso é o ganho
terreno, portanto sustentam que o “ganho” é a finalidade da piedade. Em outras
palavras eles ensinam que o Cristianismo é meramente um meio de melhorar nossa
condição e nos acrescentar vantagem terrena. Isto nós sabemos, da história de
Jó, é realmente sugestão do diabo. Jó era um homem piedoso e alguém que temia a
Deus, mas Satanás diz, “Porventura teme Jó a Deus debalde (inutilmente)?” (Jó
1:9). A sugestão vil de Satanás é que tal coisa como piedade não exista, e se
um homem faz a profissão de piedade, não é porque ele teme a Deus, ou se
importa com Deus, mas simplesmente porque ele sabe que vale à pena e isso é
para sua vantagem terrena. Satanás diz a Deus, “Mas estende a tua mão, e
toca-lhe em tudo quanto tem, e verás se não blasfema contra ti na tua face.”
(Jó 1:11). O Senhor permite que esta horrível mentira do diabo seja
completamente exposta. É permitido a
Satanás tirar de Jó tudo o que ele tem e como resultado Satanás é exposto como
um mentiroso. Em vez de amaldiçoar a Deus, Jó prostrou-se diante do Senhor e
adorou dizendo, “o Senhor o deu, e o Senhor o tomou: bendito seja o nome do
Senhor.” (Jó 1:21).
(vs.6-8) Então a verdade,
assim como a experiência do povo de Deus, prova, não apenas que piedade é
ganho, mas quando acompanhada de contentamento que confia em Deus, ela é um
grande ganho. Não trouxemos nada ao
mundo, e quaisquer que sejam as posses que possamos adquirir enquanto passamos
pelo mundo, é evidente que não podemos levar nada. Tendo sustento e com o que
nos cobrirmos – e os servos tinham isso – vamos com isso estar contentes.
(c) O apóstata seduzido pelas riquezas do mundo (vs. 9,10).
Em contraste com o
contentamento divino há a inquietação daqueles que desejam ser ricos. A riqueza
tem suas armadilhas como o Apóstolo mostra mais tarde, mas não é
necessariamente a posse da riqueza que arruína a alma, mas o “desejo de ser
rico” (N.Tn). Foi apontado que esta palavra “desejo” inclui a ideia de
propósito. O perigo é que o crente, em vez de estar contente ganhando seu
sustento, pode colocar-se com o “propósito” de coração de ser rico. Então as
riquezas se tornam o objeto em vez do Senhor. É melhor para nós apegarmo-nos ao
Senhor “com propósito de coração” (Atos 11:23).
O Apóstolo nos adverte dos
males que resultam do desejo de obter riquezas. Todos são tentados, mas aquele
que deseja ser rico vai cair em tentação e encontrar-se pego em alguma
armadilha do inimigo. Além disso, o desejo de ser rico abre caminho para
concupiscências loucas e nocivas, porque induz à vaidade e orgulho da carne, servindo
ao egoísmo e ambição. Essas são as coisas que lançam os homens na destruição e
ruína. Então não é simplesmente o dinheiro, mas “o amor ao dinheiro” que é a
raiz de todos os males. Quão solene é que seja possível ao crente ser atraído
às próprias coisas que trazem destruição e ruína sobre os homens do mundo.
Mesmo nos dias do Apóstolo alguns cobiçaram em busca de riquezas, apenas para
desviarem-se da fé e se traspassaram a si mesmos com muitas dores.
(d) O homem de Deus (vs. 11,12).
(vs.11) Em contrataste com o
apóstata que se desvia da fé, o Apóstolo coloca diante de nós as
características do “homem de Deus”. No Novo Testamento, a expressão “homem de
Deus” ocorre apenas nas Epístolas a Timóteo. Aqui é definitivamente aplicada a
Timóteo; na Segunda Epístola é aplicada a todos que, num dia mal, anda em fiel
obediência à Palavra de Deus (2 Tm. 3:17). Há coisas das quais o homem de Deus
deve “fugir”; coisas a que é exortado a “seguir”; coisas pelas quais é chamado
a “lutar”; há algumas coisas a serem “guardadas”; e algumas coisas a serem
“confessadas”.
O homem de Deus fugirá das
concupiscências loucas e nocivas das quais o Apóstolo vem falando. Não é
suficiente, no entanto, evitar o mal; deve haver a busca do bem. Além disso, o
homem de Deus deve seguir após “justiça, piedade, fé, amor, persistência,
mansidão de espírito” (N.Tn.). Independentemente de como outros possam agir, o
homem de Deus vai procurar andar em consistência com os relacionamentos de um
para com o outro como irmãos; isso é justiça. Mas a justiça de um para com o
outro é aprendida no santo temor que concretiza nosso relacionamento com Deus,
e com aquilo que é devido a Deus; isto é piedade. Além disso, o homem de Deus
procurará a fé que tem Cristo por seu objeto e “amor” que flui para os irmãos,
suportando o mal e insultos com paciência tranquila e mansidão, em vez de
impaciência e ressentimento.
(vs.12) Além disso, o homem
de Deus não estará contente fugindo do mal e seguindo certas grandes qualidades
morais. Essas são coisas, realmente, de primeira importância, mas o homem de
Deus não está contente com a formação de um belo caráter individualmente, se
indiferente à manutenção da verdade do Cristianismo. Ele compreende que as grandes verdades do
Cristianismo vão de encontro à incessante e mortal oposição do diabo e ele não
vai retroceder do conflito, pela fé.
Além disso, lutando pela fé,
o homem de Deus não esquecerá a vida eterna a qual, embora ele a possua em sua
plenitude, está diante dele. Ele deve guardá-la em gozo presente como sua
esperança sustentadora.
Finalmente, se o homem de
Deus foge do mal, segue o bem, luta pela fé e guarda a vida eterna, ele será
aquele que em sua vida faz a boa confissão diante dos outros. Ele se torna uma
testemunha viva da verdade que ele professa.
(e) O exemplo perfeito (vs. 13-16)
Para nos encorajar a manter
esta responsabilidade, o Apóstolo nos lembra de que vivemos à vista Daquele que
preserva todas as coisas em vida (N.Tn.).
Não pode Ele então preservar os Seus, não obstante quão severo possa ser
o conflito pelo qual devem passar? Além disso, se somos chamados à fidelidade,
não nos esqueçamos de que estamos debaixo do olho Daquele que tem estado diante
de nós no conflito, e Quem, na presença de contradições dos pecadores, da
inveja e insulto, agiu em absoluta fidelidade a Deus, mantendo a verdade em
paciência e mansidão, e assim testemunhado uma boa confissão.
Além disso, fidelidade terá
sua recompensa. O mandamento é, portanto, para ser mantido sem mancha e
irrepreensível, até o aparecimento de Jesus Cristo. A glória da Sua aparição
trará com ela uma resposta a qualquer pequena fidelidade da nossa parte, como,
realmente será a gloriosa resposta à perfeita fidelidade de Cristo. Assim na
verdade, quando O Homem injuriado, insultado e crucificado aparecer na glória,
haverá não apenas uma resposta completa a toda a Sua fidelidade, mas uma
completa mostra de tudo que Deus é. Será manifestado a todo o mundo o que já é
revelado à fé; isso, na Pessoa de Cristo, Deus é revelado como o abençoado e o
único Soberano, o Rei dos reis, e o Senhor dos senhores, Aquele que, na
majestade da Sua Deidade, sozinho tem imortalidade essencial e que habita em
luz inacessível.
Aqueles que formam a Casa de
Deus podem falhar no testemunho para Deus; o homem de Deus pode apenas mostrar
Deus em medida, mas em Cristo haverá a completa mostra de Deus para Sua glória
eterna.
(f) O rico neste mundo (vs. 17-19)
O Apóstolo tem uma exortação
especial aos crentes que são ricos neste mundo. Tais são assediados por dois
perigos. Em primeiro lugar, há a tendência das riquezas levar os que a possuem
a assumir um ar de mente elevada, achando a si mesmos superiores aos outros por
causa das suas riquezas. Em segundo lugar, há a tendência natural a confiar nas
riquezas, que na melhor das hipóteses, são incertas.
A proteção contra essas
armadilhas é encontrada em crer no Deus vivo, que nos deu todas as coisas para
desfrutarmos delas. Por mais que um homem seja rico, não pode comprar as coisas
que Deus dá. Por mais pobre, ele pode receber e desfrutar o que Deus dá.
Confiando no Deus vivo, que
é o Dador de todo o bem, capacitará também ao homem rico a se tornar um doador;
mas Deus ama quem dá com alegria; assim o homem rico é exortado a estar “pronto
a distribuir” e “disposto a comunicar”. Agindo assim ele estará fazendo um bom
depósito em vista de bênçãos futuras em vez de guardar riquezas para o tempo
presente. O homem que deposita para o tempo vindouro guardará aquilo que é
realmente vida em contraste à vida de prazer e deleites do nosso próprio desejo
que as riquezas terrenas podem garantir.
(g) O cientista professo (vs. 20,21).
Finalmente somos advertidos
a guardar “o depósito confiado”. A completa verdade do Cristianismo foi dada
aos santos como um “crédito” a ser mantido diante de todas as oposições. Aqui
somos especialmente advertidos contra a oposição das teorias dos homens que
provam ser completamente falsas por sujeitar Deus, Sua criação e Sua revelação
à mente do homem, em vez de estar sujeito a Deus e Sua palavra. Presunçosamente
ocupados com suas teorias infiéis eles perderam a fé.
Mackenzie & Storrie, Ltd., Printers, 28-32 Coburg
Street, Leith.
Por Hamilton Smith
Tradução:
Rosimeri F. Martins (Curitiba), revisão Batista (Limeira).
Texto
original: http://www.stempublishing.com/authors/smith/1TIMOTHY.html